18.5.09

Fugacidades (I)

Já iam-se quase sete quando ela sentou-se. Hesitante, puxou a carteira de lado e acomodou-se elegantemente. Nem de longe era a loira mais bonita que já vira. No entanto, emanava toda aquela aura ostensiva ariana que impressiona e dá impressão de grandeza.
Indiferente ao resto do cosmos, inclusive ao meu olhar espião, tomou a bolsa e retirou um livro de capa amarela. Abriu-o numa página premeditada e sacou o marcador-de-páginas com todo o desprezo de que dispunha. Atirou-o de lado. Pobre-diabo.
E foi com surpresa que a observei prender-se à leitura assim que seus olhos claros encontraram a primeira palavra. Em silêncio absoluto, pareceu abdicar de respirar por alguns momentos tamanha era sua concentração. Nem a euforia esdrúxula dos outros ocupantes do ambiente parecia desviá-la de seu foco. Hermética.
Preguiçosa, cerrou o punho e, sobre ele, apoiou a bochecha direita. O aspecto infantil a não privou da aparência contemplativa; no fim, não seria ela exatamente como eu? Eu não poderia ter certeza do que se passava debaixo dos fios dourados. Talvez as páginas somente a guiassem para suas preocupações e amenidades do tipo, as quais ela não encontraria em livro algum.
A verdade é que nada disso me dizia respeito. E nem ao bacharel, que caminhou até o tablado e, ignorando os protestos silenciosos da plateia, fez menção de dar início às formalidades. A loira, conformadamente resignada, fechou o livro. Eu fechei os olhos e abri o caderno.

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